Câmeras na escola

Com o olhar onipresente da família não se cresce.

Entrei na escola com cinco anos. Fui sempre o mais novo da turma, tinha entre um e dois anos menos que os colegas. O físico tampouco ajudava, franzino e míope. Não venham me ensinar o que é bullying, sei o que é ir para a aula e enfrentar o pátio. Isso me tornou sensível a propostas que tentam diminuir o mal-estar na vida escolar. A discussão sobre o uso de câmeras nas escolas me tocou.

As câmeras de vigilância estão em todos os lugares. No começo, a novidade incomodava, evocava um mundo controlado, totalitário. Mas logo nos demos conta que elas inibem e esclarecem crimes, ajudam em coisas prosaicas como controlar o trânsito. É uma vigilância barata, segura, muitas mais virão.

Porém, a presença de câmeras na escola coloca outras questões. O objetivo seria o mesmo, proteger e prevenir. As intenções são louváveis, mas elas esquecem um fator fundamental: a escola é a primeira socialização não controlada pelos pais e é necessário que assim seja. Com o olhar vigilante e onipresente da família não se cresce. Crescemos quando resolvemos sozinhos nossos problemas, quando administramos entre os colegas as querelas nem sempre fáceis. Entre as crianças, inúmeras de rusgas se resolvem sozinhas, os pais nem ficam sabendo, e é ótimo que assim seja.

O bullying deve ser combatido, mas não dessa forma. O preço a pagar pela suposta segurança compromete a essência de uma das funções da escola, que é aprender a viver em sociedade sem os pais e a sua proteção, evocada pela presença da câmera.

Na sala de aula e no pátio da escola cada um vale por si. É preciso aprender a respeitar e ser respeitado. Nós todos já passamos por isso e sabemos como era difícil. Não existe outra forma, é isso ou a infantilização perpétua. A transição da casa para a escola nunca vai ser amena.

Essa proposta de vigilância não se ancora em razões pedagógicas e sim na angústia dos pais em controlar seus filhos. Não creio que seja a escola que reivindicam câmeras, mas quem a paga. São os pais inseguros que querem estender seu olhar para onde não devem. Existe uma correlação forte entre pais controladores e filhos imaturos, adolescentes eternos que demoram para assumir responsabilidades. É possível cuidar dos nossos filhos mesmo permitindo a eles experiências longe dos nossos olhos. A escola é deles, esse é o seu espaço e seu desafio. A escola ajuda seus filhos a crescer e eles não estão sozinhos, os professores estão lá, acredite neles. Puxe da memória, muito do que somos foi por ter enfrentado o pátio, comigo foi assim.

05/06/13 |
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9 Comentários
  1. Texto muito bem escrito, eu nunca fui o menor da turma, mas por minha atitude inocente sempre fui vítima dos mais espertos. Apesar disso, a atitude dos meus pais, querendo me proteger em demasia, me atrapalha até hoje em minha vida adulta. Não sei lidar com dinheiro, por exemplo, e algumas situações que necessitam de maturidade eu sei que ainda não tenho, apesar de saber que já passei da idade pra isso. Superproteção dos pais não é uma prova de amor, é prova de não estar preparado para dar o melhor aos filhos visando a vida toda.

  2. Denise Azevedo de Lima permalink

    Olá, Mário!

    Penso o mesmo, sobre as câmeras na escola. Porém, a vida lá, hoje, para quem não é pop (eu também não fui e sofri o meu tanto…) é um pouco pior do que antes. Antes, os professores, realmente, estavam lá. Hoje, com raras e honrosas exceções, só há funcionários cumprindo horário. Não há mais aquela nobre figura, atenta, que intervinha, de leve, para que o mais forte não ganhasse sempre. Ou generosa o bastante para fazer o mais forte conhecer um pouco sua fragilidade, e nós, um pouco de força. Vejo a escola de hoje como um lugar desolador. Estamos vivendo uma vida escolar muito parecida com a dos filmes americanos. É um salve-se quem puder. E, neste caso, seria melhor que os professores voltassem… Abraço.

  3. andreza permalink

    Concordo muito e ainda vejo um outro aspecto: a terceirização de mais uma responsabilidade, prática cada vez mais comum em nossa sociedade. Ou seja, conversar em casa, conhecer o filho, saber o q se passa na escola, passa a ser desnecessário para os “pais terceirizadores”, afinal terão as câmeras pra provar ou confrontar algo mais grave… isto é muito desfavorável, a meu ver.

  4. Fabio Sidrack permalink

    Fiquei feliz e emocionado lendo sua crônica! Sinto saudades da sua “crônica falada”, no programa da Kátia Suman

  5. Concordo plenamente com o texto, pois os filhos precisam de diferente experiências sociais para crescer na sua socialização, desde a mais tenra infância.

  6. Letícia Forster permalink

    Querido Mário!

    Fantástico teu texto. Me fez pensar. Vou divulgar.

    Obrigado por continuar produzindo textos iluminados e inspiradores!

    Abração,
    Letícia

  7. Iná John permalink

    Aprender a fazer amigos;confiar nesses amigos;aprender a dividir, depois de fazer amigos; sozinha ou com eles, conhecer situações novas, as boas e menos boas; cair, ralar o joelho, sem ter um colo para o qual correr; descobrir quantas lágrima caem por dor verdadeira e quantos gritos eram apenas para chamar a atenção da mamãe; aos pouquinhos, bem aos pouquinhos, deixar que a auto confiança se instale.
    Um dia será a criança que vai permitir a sua criança a se tornar independente, “grande”; e se ela não aprender, como irá ensinar?Continuará a sequência dos medrosos, dos sem coragem para enfrentar coisas novas?
    Aprender é saudável, nem que seja de pouco em pouco.

  8. Eu, Leitora permalink

    Disto, pode-se desdobrar um adendo intrigante em relação ao conceito de “bullying”.
    Até onde o que se chama “bullying” hoje em dia seria necessário – ou mesmo benéfico – ao crescimento da criança, ao seu desenvolvimento em sociedade e às suas habilidades de fazer o que, por vezes, têm-se evitado na modernidade líquida: saber lidar com humanos? O que daquilo que se considera bullying é realmente prejudicial a ela? Esta parte do “bullying” que se pode considerar necessária deveria ser designada desta forma, ou o que há é realmente uma confusão de conceitos, e o que faz crescer, do”bullying”, nem bullying é?
    Sob o meu ponto de vista, o sofrimento de qualquer natureza faz amadurecer, mas pode traumatizar na mesma proporção; a dor envereda por dois caminhos. Posto que é possível tirar dela sua parte positiva, mas não é possível fugir de sua parte negativa, até onde este sofrimento valeria a pena?

  9. NA MINHA ESCOLA TABEM TIBERAM ESSA IDEIA PODRE MAS TENHO QUE ACOSTUMAR AGORA NE IMPOSSIVEL MAS TEM QUESER

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