Eleições clubísticas

Quero-queros têm ninhos frágeis, no chão, por isso defendem o território aos esporões. Os debates políticos têm mostrado essa mistura de fragilidade dos argumentos com agressividade territorial.

Já vou assumindo, sou colorada. Nascida Peñarol, porque time em geral se herda, tornei-me colorada na adolescência por influência de um grupo de amigos queridos. Veio a calhar do meu marido pertencer ao mesmo time, senão é bem provável que tivesse virado a casaca, tal a consistência da minha opção. Time se escolhe por paixão, pelo prazer de pertencer a um grupo, de brincar de rivalidade. Não tem nada de racional, mente quem disser que pensou no caso.

Conto isso porque estou confusa nestas eleições, não sei se estamos num pleito político ou num campeonato nacional. Está me parecendo mais o segundo que o primeiro: os eleitores estão debatendo e, pior, votando, com paixão clubística. Vejo manifestações políticas com ânimo de hooligans, de gente que admite votar em um por ódio ao outro. Para melhor ilustrá-las recorrerei a uma comparação etológica. Nada como o comportamento animal para simplificar a visão das coisas.

Quem mora aqui no RS está habituado a encontrar-se com quero-queros. São aves conhecidas por esse nome similar ao som que produzem, bem comuns em nossos gramados, andam aos pares e têm um esporão nas asas. Ele serve para intimidar quem se aproxima de seu ninho, que é feito de forma rudimentar e no chão. A estratégia de defesa é necessária já que, ao contrário de outras aves que fazem elaborados ninhos no alto das árvores, os quero-queros precisam compensar a fragilidade de seu ninho no chão, construído com poucas palhas, à mercê de muitas ameaças. Por isso elas têm um território bem claro, basta colocar o dedinho dentro dele que o rito de constrangimento ao invasor se inicia.

Estamos discutindo política igualzinho a essas aves defendem seu território. Fazemos vistosos voos e procuramos intimidar mostrando as garras uns para os outros. Isso certamente ocorre porque, estendendo a metáfora etológica, nossos ninhos estão no chão, sentimo-nos indefesos frente à invasão dos argumentos alheios. Nossos argumentos são frágeis e pouco elaborados como um ninho de quero-quero. Quanto maior a agressividade dos argumentos, menor é a segurança que temos da integridade dos nosso território emocional. Preste atenção nos mais raivosos, certamente serão os partidários menos esclarecidos e convencidos, os que possuem argumentos tão frágeis e expostos como um ninho de quero-quero. Estes, que hoje são em um número assustador, escolhem candidatos como quem adere a um clube de futebol, amo este porque odeio o outro e vice-versa.

O resultado de um campeonato entristece a uns e deixa a outros eufóricos, mas é inócuo. No dia seguinte, fora os humores dos torcedores, nada mudou. Já na eleição é bem diferente: nosso futuro, pelo menos a médio prazo, depende da opção na urna. Péssima temporada para tantos quero-queros.

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