Nosso aniversário também devia ser “Dia das mães”

Afinal, quem merece presente, quem já recebeu a vida, ou aquela que passou por maus bocados para que viéssemos a ser?

Nunca entendi a tradição dos presentes de aniversário. Claro que gosto de ganhá-los. Aprecio mesmo, fico deveras feliz. Acredito que estou sendo reconhecido. Aproveito para agradecer todos os presentes que já ganhei e que venha a ganhar.
Afinal, é o dia da minha fundação – meu dia portanto. O dia de ser centro do universo e tudo mais. O dia do porre narcísico autorizado e registrado em cartório. Sei que mereço festa, sei que todos a merecem.
O bom ou mau humor com que atravessamos nosso aniversário não depende do conceito que temos dele, se respeitamos – ou não – essa data, mas sim por como acreditamos ter sido recebidos por nossos pais. Revivemos nessa ocasião o cenário imaginário da nossa chegada na família. É um renascimento, é viver outra vez a vontade, a benção e o milagre que nos pôs no mundo. O aniversário celebra a força do desejo que nos fez existir.
Aniversário, portanto, nunca é pouca coisa. Como poderia não ser, se é a expressão do mito que nos funda? Por isso, queiramos ou não, o aniversário é um vórtice emocional. Por isso têm quem não goste nem consiga celebrar. Por isso os desejos mancos fazem aniversários aos tropeços.
Mas voltando a pergunta anterior, quem merece presente? A vida já é um presente. Nos foi dado o privilégio de sair do nada e abrir uma janela para o cosmo. Devemos ganhar mais um presente, ou retribuir a quem nos deu o mais importante?
Quem deveria ganhar um presente no nosso aniversário é nossa mãe. Aposto que tem um pai levantando a mão no fundo da sala dizendo: – e eu? Sim, você faz parte da equação, mas não foi teu corpo que abrigou um alien mal-educado e inconveniente. Não foi teu corpo, estufado até o limite, que um dia quase se rasgou para parir um ser birrento e chorão.
Winnicott falava que as mães passam por uma “loucura necessária” para nos ter. Depois de lhes exaurir fisicamente, psiquicamente as levamos ao portão do desatino. Tenho mais vontade de mandar flores para minha mãe no dia do meu aniversário do que no dia das mães.
Mas hoje é dia das mães, e todas as flores são poucas para homenageá-las pelo milagre de ter nos aguentado.

07/05/22 |
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